É verdade. Enfrentar oposição qualificada colabora para o bom desempenho de qualquer governo. Quase tão importante é haver, além de oposição, massa crítica interna, gente com autonomia para submeter seu comando político ao incômodo de uma reflexão frequente sobre os próprios atos.
Em geral, governantes não apreciam a ideia. O cercadinho dos bajuladores costuma ser alimentado com melhor ração do que aquela servida a quem cultiva a crença arcaica da independência de espírito como atributo virtuoso. A crítica, quando subsiste, é sob suspeição de má vontade.
O poder é melindroso. Os reizinhos, quando escutam, o fazem como ato de cortesia e esperam eterna gratidão pela atenção momentânea dedicada aos subalternos. Daí, o tempo se encarrega de ampliar os espaços por onde a mediocridade se esgueira e de cercar de providências a inteligência e seus riscos.
Nada trágico, caso seu excesso afetasse somente os governantes – eles passam, e passam ainda mais rápidos os que se julgam eternos. Mas não. O pior mal da cultura dos palácios não é o que ela causa aos transitórios governantes, mas o dano causado aos governados, pois estes permanecem.
Discute-se agora em Fortaleza, e muito frequentemente, sobre a necessidade de fortalecer a oposição política ao grupo familiar dos Ferreira Gomes, cuja sigla hospedeira atual é o PSB e a quem a cidade de Fortaleza acaba de conceder uma hegemonia política inédita nos últimos trinta anos.
Se, mais do que o exercer o poder de modo incontestável, pretendem eles legar uma obra pública que poucos reparos mereçam do futuro, deveriam cuidar em arejar seus corredores e abrir o piso lustrado de seus salões às solas empoeiradas dos que andam pelas ruas a ouvir seu povo.
Não é o que parece acontecer, a julgar pela despudorada arbitrariedade dos encaminhamentos dados a casos em que familiares seus, maiores de idade, se viram envolvidos em ocorrências policiais, quando puderam demonstrar inabalável confiança na impunidade de seus atos.
Não parece haver, nos quadros da vassalagem disponível, gente disposta a esclarecê-los de que é o exercício excessivo do poder, mais até do que os erros eventuais de quem detém a responsabilidade de mando, o que o faz menos digno aos olhos da plebe – silenciosa, mas não igualmente desatenta.
Às vezes, leio os antigos – chineses, entre eles. Lao-tsé dissera que um governante deveria retardar ao máximo seu momento de apogeu. Para a defesa da paradoxal sentença, sustentava um argumento geométrico, mas desconcertante por sua simplicidade: depois do apogeu, só há decadência.
Ricardo Alcântara é Publicitário, Comunicador, Poeta e Ficcionista, foi diretor de programa de televisão e, é autor de vários livros.