O Óleo Ungido por Moisés e a exploração da fragilidade dos angustiados

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Imagem meramente ilustrativa.

Há alguns dias, um jovem muito bem vestido pediu para falar comigo enquanto eu caminhava por uma rua de Quixeramobim. Parei, tirei o fone do ouvido e disse: “Pois não.” E ele: “Você está bem?” E eu: “Quem pergunta?”

Ele se identificou como membro de uma certa igreja, indicando a localização dela logo ali perto de onde estávamos. “Em que posso ajudar você?”, perguntei. “Na verdade, eu gostaria de saber se o senhor teria interesse em participar de uma reunião em que será apresentada a oportunidade de adquirir o óleo ungido por Moisés”, ele disse.

“Qual Moisés?”, perguntei. “Você já leu a Bíblia?”, ele me indagou em estilo bastante professoral. “Humrrum”, respondi. “Pois este é o óleo ungido por Moisés, o mesmo que recebeu do Senhor as tábuas dos dez mandamentos”, ele afirmou, devo admitir, com bastante ousadia, daquelas típicas de quem afirma algo absolutamente plausível e passível de prova.

“Onde vocês acharam esse óleo?”, perguntei. “Na terra santa”, respondeu ele. “E você tem certeza que esse óleo foi ungido por Moisés?”, indaguei. “Sim, estava na terra santa”, ele afirmou, gesticulando afirmativamente com a cabeça.

“Certo, mas você com certeza conhece o detalhe de que Moisés viveu numa época bem distante da nossa, mais de mil e quinhentos anos antes de Cristo, não sabe?”, sugeri. Ao que ele disse simplesmente: “Pois é”.

“Mas o seu óleo foi ungido por esse Moisés?”, persisti, como que tentando entender o escopo da absurda afirmação. Ele apenas respondeu positivamente gesticulando a cabeça, sem nada dizer.

“Posso lhe fazer a mesma pergunta que você me fez no início?”, solicitei. Ele consentiu. Então eu indaguei: “Você está bem? Quero dizer: você está bem mesmo, rapaz?” Ele não disse nada, e ficou apenas me olhando enquanto eu me afastava.

Fiquei me perguntando se eu estava naquele dia com aquelas caras de interno de alguma repartição destinada à contenção de inimputáveis psiquiátricos, já que ele apostou que eu me interessaria por oferta tão absurdamente bizarra.

Você precisa ser completamente maluco para oferecer algo assim aos outros, e precisa ser completamente maluco para aceitar algo assim dos outros. Mais impressionante ainda é que as pessoas chegam a COMPRAR tais coisas na firme crença de que, de alguma forma, elas tenham sido mesmo ungidas por esta ou aquela personagem.

Pois bem. Neste último sábado, 31, passei pelo mesmo local e lá estava o indivíduo oferecendo o mesmo óleo. Não resisti. Fui lá e perguntei se haviam comparecido à reunião em que o óleo ungido foi apresentado. Acho que ele respondeu até de forma instintiva: “Sim, foi lotação. Não sobrou nada. Graças a Deus.” “E hoje você está oferecendo o que?”, quis saber. “Ainda é o óleo ungido”, esclareceu. “Mas você não disse que havia acabado?”, perguntei mais. “Essa é outra remessa”, ele explicou. “Ah, bom, então está explicado!”, disse a ele, antes de me afastar.

Eu sei, é inacreditável. Mas aconteceu bem ali em Quixeramobim. E acontece em todo o Brasil. Mais impressionante ainda é que multidões se sentem atraídas a este tipo de oferta bizarra.

Talvez o que explique essa disposição seja a angústia das pessoas, as aflições que fragilizam a racionalidade e que as fazem querer acreditar que as soluções que lhes são oferecidas, de um jeito ou de outro, tem chances de funcionar. Senti dó de ambas as partes, dos que oferecem e dos que aceitam em desespero. Não foi possível sentir outra coisa que não isto, embora ache que, em certos casos, os primeiros mereceriam uma boa punição. É tão feio se aproveitar das dores alheias…

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Por Gooldemberg Saraiva / Contato: (88) 9 9972-5179 / bergsaraiva@gmail.com




Comentários

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  1. Deus não existe,tudo que existe veio a ser em algum momento,portando Ele não é objeto da nossa afirmação para sua existência.
    Ou se tem fé ou não tem para se crê em Deus e na sua existência .

  2. Do mesmo modo se trata da crença que deus existe. E será mesmo que deus existe? Quem pode provar. Que o viu?

  3. É por causa desses tipos de mercenários que faz das promessas de Deus fonte de dinheiro, que pastores sérios, que vivem uma vida verdadeiramente dedicada ao seu ministério diante de uma sociedade laica, passam a serem afugentados e vítimas de preconceito. Não há relatos bíblicos que este óleo ficaria para fins futuros, veja: a bíblia fala que tomou então Moisés o óleo da unção e ungiu o Tabernáculo, e tudo o que havia nele, e os consagrou. Fez sete aspersões sobre o altar e ungiu, a fim de os consagrar, o altar e seus utensílios, a bacia e sua base. Livro Levítico Cap. 8, Versiculo 10. Cremos no óleo que é consagrado nos dias de hoje por quem vive uma vida voltada para Deus, mediante um dogma de fé, usados em cultos em que há enfermos, assim como outras religiões que conhecem a função do óleo ungido. (Ato simbólico), mais que exite um óleo do período de Moisés e isto é uma falta de respeito e de caráter, este que está oferecendo este óleo esta equivocado e merece ser é preso, tanto ele como o que é responsável por ele, não passa de um falso profeta, ludibriador que engana aos outros e a si mesmo com doutrinas errôneas. Este nunca foi um cristão, pois faz o que a bíblia não pede e nem é um cidadão pois comete atos que a lei não manda.

  4. É o santo nome de Deus tomado em vão. É a profanação à palavra do Senhor. Isso acontece tanto na rua, como dentro dos templos de algumas representações evangélicas. É uma verdadeira profanação à casa do Senhor. São verdadeiros profissionais vendendo indulgências, utilizando o nome de Jesus Cristo e se beneficiando da fé dos mais necessitados. É o aumento da riqueza dos grandes líderes de templos evangélicos espalhados pelo mundo, principalmente em nosso Brasil. Tenha misericórdia Deus Pai Todo Poderoso.

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