A Universidade Federal do Ceará (UFC) deu um passo importante no combate ao assédio sexual em sua comunidade acadêmica: este ano, pela primeira vez na história da instituição, agressores envolvidos em dois casos ocorridos no Campus de Quixadá receberam a punição de desligamento. A medida se deu após instauração de comissões, compostas por servidores e discentes da unidade acadêmica, que apuraram os fatos e definiram o procedimento.
Os casos de assédio ocorreram em 2024 e envolveram estudantes. As vítimas, do sexo feminino, formalizaram denúncia na administração do campus contra os agressores, ambos do sexo masculino, no segundo semestre do ano passado. Logo após, foram criadas comissões internas para analisar os casos e, diante da gravidade das ações, foram emitidos pareceres favoráveis ao desligamento dos agressores. Em seguida, os processos foram analisados quanto à conformidade às legislações e normas da UFC e, ao final, os desligamentos foram sancionados pelo reitor.
ACOLHIMENTO – Uma das primeiras pessoas a tomar ciência e atuar no caso foi Rayanny Alves, assistente social do Campus de Quixadá, que ouviu o relato das vítimas. De acordo com a servidora, um dos principais focos naquele momento foi o acolhimento. “As estudantes que me procuraram se sentiam com medo. Uma delas estava faltando às aulas por se sentir insegura em conviver no mesmo espaço que o agressor. Inicialmente as acolhi, depois formalizei o processo de denúncia internamente, tendo cuidado para que as vítimas não fossem revitimizadas. Elas receberam orientação sobre seus direitos e foram apoiadas durante todo o processo”, comenta a assistente social.
Quem também integrou esse processo foi o professor João Vilnei, coordenador do Núcleo de Comunicação do Campus da UFC em Quixadá. Ressalta o docente que o sigilo dos trabalhos e o respeito aos envolvidos deu a tônica da comissão de apuração dos casos. Ainda segundo Vilnei, a atuação mais efetiva da UFC nesses episódios, com a culminância no desligamento dos agressores, implica no fortalecimento do combate aos assédios no cotidiano naquela unidade acadêmica.
“Esse assunto tem que aparecer nas aulas, nos trabalhos, nos projetos de extensão, nos eventos que realizamos, não pode ser só falado quando aparece um caso. A universidade tem enorme potencial de contribuir com a sociedade na construção de um mundo melhor para as mulheres e, se isso não está acontecendo, estamos todos falhando”, avalia.
MEDIDA INÉDITA – Anteriormente, as punições mais severas aplicadas em caso de assédio sexual, conforme o regimento da UFC, eram de, no máximo, três meses de suspensão. Isso ocorria, em maior parte, pela ausência de determinações específicas a respeito nos normativos da UFC. “Acho que os casos nos ajudaram a perceber a importância de se regulamentar minimamente o passo a passo para casos como esses”, afirma João Vilnei.
No sentido de uma atuação mais efetiva contra os assédios, tanto no campo do combate quando no da prevenção, a universidade instituiu, no segundo semestre de 2023, a Comissão de Enfrentamento e Prevenção ao Assédio Moral e Sexual da UFC, que vem trabalhando na construção de uma política institucional contra o assédio. No primeiro semestre deste ano, foram realizadas etapas de audiência e consultas públicas nos campi da UFC na capital e interior e, em agosto, a minuta da política foi entregue ao Gabinete da Reitoria
Segundo a pró-reitora-adjunta de Assistência Estudantil da UFC, Márcia Arão, co-presidenta da comissão, a ideia é que agora o texto seja encaminhado para apreciação do Conselho Universitário (Consuni). Destaca a gestora o envolvimento da comunidade acadêmica no desenvolvimento da minuta.
“A atividade para construção da minuta da política mexeu com a comunidade acadêmica, trazendo luz à temática dentro da universidade, seja promovendo discussões, seja divulgando os canais que tínhamos para denúncia e apuração já existentes na UFC, como a Ouvidoria e a Comissão Permanente de Processo Administrativo Disciplinar (CPPAD). Também fortalecemos as diretorias das unidades acadêmicas para apurar e aplicar as penalidades cabíveis nos casos que os assédios e discriminações acontecem entre discentes. Então, penso que o resultado do processo de apuração desses casos em Quixadá é fruto de toda essa movimentação”, pontua.


