CPI da Saúde usou pesos diferentes ao avaliar condutas de investigados

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O relatório apresentado pela CPI da Saúde à Câmara Municipal de Quixadá nesta segunda-feira, 04, contém sinais IMG-20140805-WA0010claros de abordagens diferenciadas para alguns dos principais investigados.

Ao passo que em determinadas linhas se exprime firmeza e rigor, noutras a CPI simplesmente tenta empurrar goela abaixo uma abordagem desinteressada e superficial. Tudo depende, claro, do indivíduo em tela.

Com o necessário e correto rigor, a CPI verificou que procedimentos importantes foram atropelados pelo ex-prefeito Ilário Marques quando da execução do projeto de reforma do Hospital Eudásio Barroso, o que resultou em inúmeras paralisações na obra e, posteriormente, em prejuízo aos cofres públicos. Concordemente, a comissão investigadora sugeriu, de forma correta, a aplicação de nota de improbidade administrativa e obrigação de reparação civil ao ex-gestor do município.

Algo notável em relação ao tratamento dispensado neste caso está escondido na seguinte passagem do relatório:

“… pode-se concluir pela Ingerência Administrativa do Gestor com a verba e coisa Pública com consequente dever de reparação Civil dos atos aos quais deu causa diretamente, ou através daqueles que, através de livre nomeação, elegeu para tais funções.”

10530667_682766425141077_5359599843415597628_nIsto quer dizer que a CPI entendeu que Ilário Marques, na condição de prefeito municipal, carregava responsabilidade pelas ações daqueles a quem havia substabelecido poderes para representá-lo, entendimento certamente correto e já aceito em diversos casos nas cortes de justiça do Brasil. Prefeitos são responsáveis diretos ou indiretos (“através daqueles que, por livre nomeação, elegeu para funções específicas”) pelas ações levadas a cabo pelo poder que gerenciam.

É notável como este entendimento deixou de ser aplicado ao atual gestor do município, o prefeito João Hudson Bezerra. Ao discorrer sobre o que chamou de “ingerência administrativa” na área da saúde de Quixadá, note como a CPI blinda o prefeito e o exime de qualquer responsabilidade:

“… a Comissão Parlamentar de Inquérito constata a Ingerência Administrativa no que pertine a aquisição de medicamentos e materiais médico-hospitalares, tendo como responsáveis os gestores que passaram pela pasta da Saúde, salvo comprovação fática posterior de que não deram causa a morosidade apresentada.”

Agora, usando um peso diferenciado, a comissão entendeu que o prefeito atual não carrega responsabilidade pelas ações daqueles que, por livre nomeação, elegeu para funções específicas. Somente os secretários são culpados. O prefeito não. A afirmação assume tons ainda mais ridículos quando nem mesmo nomeia os que passaram pela pasta, individualizando suas condutas condenáveis, deixando o assunto no terreno do generalismo e do indeterminado. Aos olhos desta CPI, Quixadá não possui prefeito para responder pela administração. Só tem secretários.

IMG-20140805-WA0019A comissão detectou que a ex-secretária de saúde, Lívia Mara Bezerra, praticou usurpação de função pública, assinou processos licitatórios com datas retroativas, obrigou funcionária pública a assinar recebimento de mercadorias que nunca foram entregues e, assim, tratou com imoralidade o cargo que lhe foi confiado.

Neste último caso, ou o prefeito não sabia que estavam faltando medicamentos e materiais, ou sabia e não se interessou em cumprir seu papel de investigar as ações daqueles a quem confiou poderes, permitindo por negligência que tais práticas se desenvolvessem em sua administração.

Porém, novamente, a CPI não vislumbrou a existência de prefeito em Quixadá, apenas de secretários, e deixou de perceber que a pessoa mais apta a fiscalizar e impedir desvios éticos, morais e legais em uma administração pública é o próprio chefe do poder, ou seja, o prefeito. Quando ele não participa diretamente nos fatos ilícitos, ao menos sua provável negligência em fiscalizar deveria ter sido apurada, coisa que a CPI passou longe de fazer, já que nem o básico do básico fez:  obter depoimento diretamente do prefeito.

Em contrapartida, não houve nenhuma dificuldade em convocar Ilário Marques e Rômulo Carneiro.

É também escandalosa a benignidade destinada ao prefeito que permitiu que o então Diretor do Hospital, Michel Ximenes, pagasse do próprio bolso os salários dos médicos sob sua supervisão, dinheiro que, posteriormente, lhe era devolvido pela cooperativa DINAMICA, em procedimento que afronta todos os princípios que devem nortear a administração pública.

Em reunião com vereadores, a ex-secretária Aida Magalhães deixou claro que o prefeito tinha conhecimento de diversos procedimentos questionáveis mantidos sob o teto da Secretaria de Saúde; mesmo assim, a CPI não se esforçou para esmiuçar até que ponto o prefeito poderia ter evitado que tais práticas se perpetuassem em sua gestão.

E nem se fale acerca da contratação dos serviços da DINAMICA, cooperativa médica considerada pela CPI como “entidade mercantil”, na qual se vislumbrou a inexistência de “legalidade em sua contratação na forma prevista na Constituição Federal.” Por causa do contrato com esta cooperativa ilegal, a CPI sugeriu aplicação de nota de improbidade administrativa ao ex-prefeito Rômulo Carneiro.

O interessante, porém, é que as mesmas irregularidades verificadas na gestão anterior foram comprovadamente verificadas também na gestão atual. Mas cadê a recomendação de aplicação de nota de improbidade administrativa ao prefeito atual? Ou será que a assinatura do prefeito atual não existe no contrato com a DINAMICA?  Isto, por si só, dá base para que os vereadores cassem o mandato de João Hudson, mas resta saber se a Câmara será tão cega quanto a CPI.

A CPI da Saúde não enxerga o atual prefeito, blindando-o de responder pelo caos absurdo na administração da saúde em Quixadá.

O que se conclui é que esta CPI usou pesos diferenciados ao avaliar condutas semelhantes de diferentes agentes. Vergonhoso. E será ainda mais, caso os vereadores aprovem este relatório sem implementar as emendas necessárias para corrigir este documento que, para todos os efeitos, é uma afronta à inteligência, honradez e dignidade dos cidadãos de Quixadá.

 




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