A imprensa de Quixadá e a difícil tarefa de ter que não ter um lado

- por
  • Compartilhe:

Há alguns dias atrás, publiquei matéria informando que certa classe de trabalhadores a serviço da prefeitura de Quixadá estava com salários atrasados. Um leitor foi até o chat do Facebook e me mandou a seguinte mensagem: “Seu petista corrupto. Por que você não pára de criticar o prefeito e vai fazer alguma coisa honesta da sua vida?” Dei a resposta padrão: “Obrigado por ler minha coluna. Fico feliz por seu apreço. Passe bem.”

Alguns dias após este episódio, publiquei outra matéria na qual informava que a prefeitura havia reiniciado as atividades em um posto de saúde na localidade de Sabonete, zona rural deste município. Outro leitor fez questão de postar a seguinte observação numa rede social: “É impressionante como esse Jaime muda de lado o tempo todo.”

“Muda de lado o tempo todo.” Isso ficou martelando meus amigos Tico e Teco. A verdade é que muita gente espera que os profissionais da imprensa não tenham lados nas rinhas políticas travadas localmente, mas pressiona-os a adotarem um. Todos querem ler coisas boas sobre o lado que defendem e coisas ruins sobre o lado oposto. Já passei a encarar isso de modo muito natural, e não me sinto de forma alguma ofendido pelas críticas que recebo em virtude daquilo que escrevo nesta coluna.

A bem da verdade, sinto verdadeiro alívio que alguém me julgue como ‘mudando de lado o tempo todo’. Não sei se a pessoa analisou direito a lógica da declaração, mas o máximo que isso diz é que não tenho lado nenhum. Um dia sai uma coisa boa sobre este e ruim sobre aquele. Noutro dia sai algo bom sobre aquele e ruim sobre este. Mas o desejo, às vezes inconsciente, de forçar a imprensa local a adotar um lado impede que alguns leitores reconheçam que quem produz os fatos noticiados não é o comunicador, mas os agentes diretos daqueles fatos.

Permitam contar-lhes outro episódio. Um leitor enviou-me um e-mail pedindo que eu publicasse uma matéria dizendo que o ex-prefeito Ilário Marques não poderia ser candidato até 2024. Perguntei como ele havia calculado isto, e ele me respondeu simplesmente: “Os processos dele o impedem. Já tem uma condenação por órgão colegiado e é ficha suja.” Daí pensei: “Esse assunto merece ser considerado. Se Ilário está impedido de se candidatar até 2024, esta informação é relevante para milhares de quixadaenses e tem status de notícia.” O que fiz em primeiro lugar? Solicitei uma conversa com Ilário Marques.

Ao ouvir a defesa dele, descobri que a história não é exatamente como o leitor havia me sugerido. Ilário enfrenta, de fato, vários processos na justiça. Tem pelo menos uma condenação por órgão colegiado, mas seus direitos políticos não foram cassados. De modo que, até este momento, não parece haver objeção legal à sua candidatura a cargos públicos eletivos, embora a discussão sobre este tema não produza conceitos unânimes. Discuti essa informação com a direção do Sistema Monólitos, que adotou a seguinte postura: Se não parece haver objeção, e se as conclusões sobre o assunto não são unânimes, não podemos dizer nada mais além disto. Concordemente, no dia em que a notícia sobre a condenação de Ilário pelo TRF foi publicada, não foi dito que ele não poderia ser candidato até 2024, como o leitor havia solicitado, e a falta de unanimidade sobre a legalidade dele ser ou não candidato foi tratada sem que julgamentos conclusivos tenham sido feitos. Além disso, o esclarecimento do próprio Ilário recebeu destaque. Evidentemente, aquele leitor desejava ler outra coisa.

Em contrapartida, não conto a quantidade de pedidos que me foram feitos para publicar matéria sobre um recente episódio de descontrole envolvendo membros de destaque da família do prefeito João Hudson. Alguns sugeriam a publicação de frases com teor de chacota e o uso de termos depreciativos, destinados, obviamente, a causar constrangimentos à família do gestor. Recusei-me a fazer isto por uma razão simples: o episódio não possuía, ao menos não na minha humilde opinião, status de notícia. Não me pareceu relevante sob nenhum aspecto. Claro que a fofoca era boa. Se eu disser que o povo não gosta de fofoca, estarei mentindo. Gosta sim, elas geram acessos. Então, que o episódio fosse publicado em espaços destinados a isto. Não é o caso da minha coluna. Se o Sistema Monólitos quisesse publicar, que o fizesse fora da minha aba, na área geral deste site. Felizmente, eles também não trataram o assunto como relevante.

O que se vê a partir destas experiências é que existe, de fato, uma pressão descabida para que a imprensa adote lados. E se o comunicador escolhe não fazer isto, possivelmente será qualificado como ‘mudando de lado o tempo todo’.

Isto quer dizer que os comunicadores não possuem lados de jeito nenhum? Claro que não. Muitos adotam um, e por razões múltiplas sobre as quais não me sinto justificado a fazer comentários. Eu mesmo, por vezes, tomo posição clara sobre um assunto em debate. Achei um absurdo, por exemplo, a expulsão do plenário, pela via do voto, dos promotores de justiça, numa recente sessão da Câmara Municipal. Falhou o presidente Pedro Baquit ao não conduzir as questões relacionadas com a presença do MP com a devida antecedência; e falharam os vereadores da bancada do prefeito ao escolherem lidar com isto pela via da deselegância.

A imprensa local, portanto, lida com a difícil tarefa de ter que não ter um lado, especialmente ao lidar com gente que acha que a imprensa deve ser totalmente imparcial. Dever, deveria, mas não é infelicidade reconhecer que não consegue. Imparcialidade absoluta é mito. No máximo, a imparcialidade é um valor que precisa ser buscado, pois essa busca daquilo que é sabidamente inalcançável, tenderá a produzir resultados mais justos com todas as partes apreciadas no trabalho do comunicador.

Para além disto, resta afirmar a importância do trabalho de todos aqueles que lidam com a difícil arte da comunicação. Quanto devemos a eles! Muito daquilo que a classe política faz pelo povo é feito em razão de coberturas jornalísticas. Cada comunicador, então, merece ser apreciado pelo importante papel que desempenham. Não importa de que lado esteja, ou se muda de lado o tempo todo, devemos muito à nossa imperfeita, porém persistente, imprensa local.




Comentários

Os comentários abaixo não representam a opinião do Monólitos Post; a responsabilidade é do autor da mensagem.
  1. JAIME ARANTES, tenho acompanhado com cuidado o teu trabalho de comunicador. Na verdade, te parabenizo diante de tua maneira de noticiar os fatos ocorridos em nosso querido Quixadá. Sinto-me no dever de te agradecer pelo trabalho construtivo que tens desenvolvido na imprensa quixadaense. Abraços!

  2. A questão nem é ter lado talvez..
    O problema é a acusação desnecessária e a fofoca.
    Uma coisa é alguém chegar no monolitospost e falar o que pensa de um partido ou do João. Outra é inventar algo que não é verdade.
    Tem muita gente por aí que não sabe a diferença.

  3. A grande questão é: 1) a imprensa não deve ser golpita, ou seja, ser uma PIG – PARTIDO DA IMPRENSA GOLPISTA, pois como sabemos, grande parte da mídia do Sul e Sudeste do pais, é golpista, pois dá mais enfase a notícias contra certo partido, no caso o PT, como se só no PT existissem corruptos, e deixam de lado muitas coisas que são feitas de forma errada, corrupta que é praticada por políticos de outros partidos; 2) Os partidos devem ser partidos mesmos, com suas ideologias, não querendo ser empresas dominadas por caciques, por grupos de pessoas que lutam pelos interesses em sua maioria da classe alta, com seus interesses próprios em detrimento do bem da coletividade; 3) A corrupção deve ser combatida de todas as formas; 4) cargos de vereadores, prefeitos, secretários devem ser ocupados por pessoas voluntárias, assim como é na Suécia, as pessoas lá que ocupam cargos semelhantes são voluntárias, e ganham alguma coisa pelo serviço presta, não necessariamente com um salário fixo, enfim coisas que aqui deveria acontecer, e se acontecesse, com certeza os que estão ai ocupando cargos públicos, em sua maioria, quase cem por cento, não iriam nunca se reeleger; 5) cargos públicos do legislativo, deveriam ser através de concurso e provisórios, enfim cargos ocupados por pessoas preparadas e não por pessoas aventureiras, despreparadas e descompromissadas com a coletividade…

  4. Costumeiramente acompanho seus textos e nem sempre concordo com eles. Na verdade acho injusto como voce e outros desinformaram a populacao ao afirmar que OS PROMOTORES FORAM EXPULSOS DA CAMARA, enorme falta da verdade. Os promotores ja haviam formalizado a denuncia e nao estava prevista a presenca de nenhum deles, seja no regimento interno, Lei Organica ou convite formal da Camara. O que acontecia naquela data era parte de um julgamento e ao meu sentir o intuito do convite extemporaneo do presidente e do vereador Higo Carlos seria unicamente jogar o respaldo do MP contra a defesa do prefeito e contra membros da camara que discordavam da denuncia. O nome disso pressao? E depois vendo video que circula na internet pude confirmar que nao houve deselegancia alguma da bancada que nao concordou com o recebimento da denuncia, sequer foi solicitada a saida dos membros do Ministerio Publico, saliento, a lei foi obedecida. Quanto aos que colocaram os fiscais da lei sob constrangimento voces silenciaram e nao vi repudio algum a atitude do Vereador Higo Carlos em publicar no facebook oficio nao enderecado a ele com intuito unicamente de tentar intimidar homens e mulheres independentes, honestos e dignos. E preciso alertar aqueles que desejam agradar ao ex prefeito Ilario Marques que nao e ele que decide ser ou nao ficha suja, consulte um jurista da area ou leia o que esta na Lei que regula a materia, Ficha suja continua FICHA SUJA, querendo ou nao!

  5. Será amigo, acho que o povo que eu vejo em qualquer canto da cidade, de um lado ou do outro, é outra história.. e
    toda cidade sabe o que é…interesse de um ou outro partido…..para
    ficar no poder….

Deixe seu comentário

Os comentários do site Monólitos Post tem como objetivo promover o debate acerca dos assuntos tratados em cada reportagem.
O conteúdo de cada comentário é de única e exclusiva responsabilidade civil e penal do cadastrado.