Na democracia, a ignorância é uma aliada forte daqueles que se veem incapacitados de convencer pelo argumento. Isto talvez explique o déficit histórico de investimentos na educação e o descaso geral, em todo o país, com a preparação intelectual dos cidadãos. Quanto mais ignorante o povo, mais fácil manipulá-lo. A promoção sub-reptícia da ignorância esconde intenções eleitorais com vistas a projetos de perpetuação de poder.
No Ceará, a divulgação de informações que visam manchar a reputação dos adversários é uma conduta praticada por ambas as campanhas neste segundo turno.
Eunício Oliveira, por exemplo, tem sido apontado em um vídeo cuidadosamente produzido, como sendo o responsável pela miséria que assola sua terra natal, Lavras da Mangabeira. Entrevistadores, obviamente desonestos, aproveitaram-se da ignorância popular e induziram cidadãos daquele município a reclamar da suposta negligência de Eunício com seu povo e a atribuir a isto a razão de suas dificuldades. Nada mais desonesto, repito. Um pouco de conhecimento sobre o papel dos senadores e dos governadores é suficiente para apontar quem, entre Eunício e Cid Gomes, carrega maior culpa pelos problemas de Lavras da Mangabeira.
De acordo com a Constituição Federal, as funções dos Senadores da República são meramente legislativas, cabendo-lhes, por exemplo, propor projetos de lei, sugerir alterações nas leis vigentes, fiscalizar o executivo federal, aprovar nomes para cargos específicos, etc. Senadores não possuem as funções dos poderes executivos, tais como os de prefeito, governador e presidente.
A jogada desonesta do vídeo é fortalecer a crença ignorante de que um Senador é o verdadeiro responsável pelos problemas de um município, escondendo das pessoas que uma coisa nada tem a ver com a outra.
Por outro lado, muito mais responsabilidade pela situação de crise nos municípios cuja aglomeração lidera pode ser atribuída ao Governador de Estado, este sim com funções executivas. Muito mais correto, portanto, seria responsabilizar Cid Gomes e seu governo pelos problemas de infraestrutura que massacram o Estado, incluindo-se nele Lavras da Mangabeira. Conforme os melhores mapas, Lavras ainda está situada no Ceará, governado há oito anos pela família Ferreira Gomes.
Curiosamente, em outro vídeo, Cid Gomes aparece num comício em Lavras da Mangabeira, ao lado do próprio Eunício, afirmando o seguinte:
“Eu devo profundamente ao Eunício Oliveira, esse Senador que vocês devem se orgulhar muito. Eunício me deu numa hora decisiva o apoio decisivo para que eu pudesse realizar o sonho de governar o estado do Ceará. Na política, tem gente que quer servir, e tem gente que quer ser servido. O amor, o carinho, o cuidado, a preocupação que o Eunício tem pela sua terra – eu digo isso porque eu sinto a mesma coisa-, o Eunício valoriza Lavras acima de qualquer outra coisa ao longo de sua vida pública. As vezes que o Eunício me procurou para alguma solicitação, nunca foi pra ele, mas sempre para trazer alguma coisa aqui para o município de Lavras da Mangabeira.”
E então? O povo de Lavras deve ou não deve se orgulhar de Eunício Oliveira? Se a palavra de Cid vale um vintém, deve sim. Mas quando os interesses falam mais alto em campanha, é hora de manipular a ignorância em busca dos votos. Como costuma dizer Lula, “este é o dado concreto”.
Mas apoiadores de Eunício Oliveira, por vezes, também adotam posturas semelhantes, especialmente ao tentarem passar a ideia falsa de que o candidato Camilo Santana é réu condenado em processo por desvios de dinheiro público. É verdade que Camilo foi investigado, teve seus bens tornados indisponíveis, porém, caso tivesse sido condenado definitivamente pelo tal do escândalo dos banheiros, estaria ele concorrendo ao cargo de governador? Claro que não. A Lei da Ficha Limpa não deixaria.
E assim, aproveitando-se da ignorância popular, uns mais, outros menos, os políticos vão galgando a confiança do povo. Já dizia o velho Sócrates: “Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância.” Se isso é verdade, a massa de manobra e a massa manobrada não pode, com certeza, ser chamada de sábia. A ignorância parece não ter limites.


