AÇUDE DO CEDRO> Responsabilidade da Prefeitura de Quixadá e da União em face da degradação patrimonial

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Inicialmente, aos amigos e estudiosos do direito público, quero pedir perdão por essa ousadia e confessar que, quando me propus a escrever este singelo texto, o fiz como forma de homenagear os grandes amigos que apreciam o estudo sobre o Direito Administrativo brasileiro.

Espero que esta publicação possa contribuir de alguma maneira para aclarar alguns aspectos, cuja elucidação, muitas vezes, torna-se bastante complexa. E se atingir tal objetivo, dar-me-ei por satisfeito, sobretudo buscarei apresentar em uma linguagem de boa compreensão para todos os que se interessam pelo tema.

Hoje os países democráticos, especialmente o Brasil, reconhecem de forma pacífica em seus diversos ordenamentos jurídicos e jurisprudências universais que o Estado (Pessoa Jurídica de Direito Público) é sujeito responsável pelos seus atos, tendo, consequentemente, o dever de ressarcir as vítimas dos danos causados em razão de sua atuação (omissiva ou comissiva).

Esse dever de responder é uma regra inerente ao Estado Democrático de Direito e essa responsabilidade é uma consequência necessária da forte presença adquirida pelo ente estatal nas relações em sociedade interferindo, cotidianamente, cada vez mais nas relações individuais.

Dito isto, é de conhecimento geral e notório os inúmeros e lamentáveis incidentes danosos que vêm assolando o Complexo Patrimonial Histórico e Cultural da União situado no Açude do Cedro localizado em Quixadá-CE, sertão central do Estado do Ceará.

Como se não bastasse o perceptível estado de abandono por parte dos respectivos órgãos originários (IPHAN & DNOCS) responsáveis pela manutenção do complexo patrimonial do Açude do Cedro.

Desde o mês de agosto de 2001, que a principal parte turística do complexo está sob a responsabilidade da Prefeitura Municipal de Quixadá, em razão de um convênio firmado, onde, tanto o DNOCS como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) poderiam interceder administrativamente diante do atual quadro danoso e constantemente ameaçador na referida área em torno do Açude do Cedro.

Nesse sentido, as medidas administrativas cabíveis são abundantes e vão desde a simples notificação até as medidas que podem ensejar a dissolução do convênio.

Não obstante, o controle judicial não se afasta da presente situação comissiva por omissão, pois o complexo se encontra há mais de 12 anos em um visível estado de abandono público.

Nesse ponto convém ressaltar acerca da expressão “Responsabilidade Civil do Estado”, ora adotada, pois sendo a mais correta, haja vista que não me refiro à responsabilidade da Administração, porque a Administração, ao contrário do Estado, é a máquina estatal, é a estrutura física da pessoa jurídica.

E, por isso, não tem personalidade jurídica, portanto não deve ser sujeito de direito e obrigação. Entretanto, nada impede as possíveis ações regressivas.

Portanto, no caso em tela, o dever de preservar, vigilar e salvaguardar os bens patrimoniais históricos e culturais do Açude do Cedro não ocorreu, diante do visível estado de deterioração e das atuais circunstâncias conforme se encontra o referido local.

Essa Responsabilidade Civil é, inevitavelmente, tanto da União, solidariamente, quanto do Município, objetivamente.

Pois, em linhas gerais, ambos, englobam em suas respectivas funções, uma via de mão dupla, com direitos e deveres, serviços e ações essenciais à manutenção e preservação desse Patrimônio Público.

Tudo isso com um dever de cuidado muito maior do que o da responsabilidade privada, implicando consequentemente uma maior responsabilidade constitucional e consequentemente um menor nível de aceitação por falhas cometidas.

Ademais, sabemos que a Constituição Federal estabelece que é função da UNIÃO, do Estado e dos MUNICÍPIOS, com o apoio da comunidade, preservar os bens culturais e naturais brasileiros.

Tendo em vista que se trata de um patrimônio tombado, encontra limites estabelecidos por lei impedindo vontades individuais que ameacem este bem de interesse público, bem como direitos que visam resguardar e garantir efetivamente os interesses não só patrimoniais, mas também socioculturais.

Entretanto, passaram-se mais de 12 (doze) anos e a situação em torno do complexo histórico e cultural do Açude do Cedro continua piorando, não havendo que se falar em falta de conhecimento por parte das respectivas pessoas jurídicas competentes, Município e União.

Sendo que, a nosso ver, ambos, o Município e a União possuem responsabilidade solidária e graças ao direito constitucional moderno, o Estado possui responsabilidade objetiva em decorrência dos danos causados pelos seus atos, independentemente de dolo ou culpa em sentido estrito, nos termos do artigo 37, §6°, da Constituição Federal, assegurado o direito de regresso contra os responsáveis nos casos de dolo ou culpa.

Dessa maneira, hoje a responsabilidade objetiva é regra no Brasil, acatada como padrão a teoria do risco administrativo. Nesse interim, a jurisprudência e a doutrina predominante admite ser possível a compatibilizá-la com a responsabilidade subjetiva, nos casos de danos decorrentes de atos omissivos, seguindo, nesse caso, a teoria da culpa do serviço.

Para isto, basta comprovação, mediante o devido processo legal, da conduta estatal, os danos e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano.

Onde a responsabilidade civil do Estado pode ser o resultado de comportamentos comissivos por omissão, pois tinham a obrigação legal de preservar, restaurar, manter e vigilar, mas respectivamente não o fizeram as pessoas jurídicas Município e União.

Sobretudo, a visível lesão patrimonial é clarividente. Lamentavelmente até quando a Sociedade e o Ministério Público permitirão esse descaso com o patrimônio histórico e cultural brasileiro?

Já é tempo de ser adotado alguma providência legal, pois a situação ultrapassou em muito os limites de admissibilidade para uma Ação Civil Pública, que deve ser provocada não apenas por parte dos representantes do Ministério Público, mas também com a participação das entidades competentes nos moldes da Lei 7.347/85.Pois, trata-se de uma questão que envolve interesses difusos e coletivos socialmente relevantes para toda a nação brasileira.

Que seja promovida uma Ação Civil Pública sem interesses partidários, mas sim, no sentido de provocar uma eficiente preservação e reparação, levando-se em consideração a responsabilização civil por conta dos irreversíveis prejuízos causados até o presente momento ao patrimônio público histórico e cultural brasileiro, oportunamente presenteado, por Dom Pedro II, ao Sertão Central do Estado do Ceará.

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Lutero Queiroz – Presidente da Associação Popular para os Direitos da Cidadania.




Comentários

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  1. Colegas,

    somente hoje me caiu as vista esta pertinente matéria sobre a qual venho labutando a anos com a impressão que vivo a falar as pedras e paredes. Uma das estratégias políticas dos governos ditatoriais é exatamente essa, colocar uma pedra sobre os problemas por eles gerados por omissão ou interesse diverso, para que sejam esquecidos ou que ficamos na situação desconfortável da impotência diante do abuso. No caso presente, o que temos em pauta não é uma simples omissão de função por parte do estado e seus entes, mas uma estratégia maquiavelicamente orquestrada pelo gestão petista do ex prefeito Ilário Marques para a completa urbanização dessa área histórica e natural do nosso município. Aqui vemos se concretizar o crime premeditado, a exemplo, de um adulto que solicita a justiça a guarda de uma criança para lhes fazer o papel de pai e cuidador, e passa a usá-la de forma torpe e perversa. Explico: Já no momento da assinatura do referido Termo de Comodato em 2001, quando o Dnocs com a conveniência do Iphan, transfere a guarda do patrimônio do perímetro a jusante da parede da represa a Prefeitura, o executivo já tinha em mãos um plano de expansão urbana dessa área em cima de interesses da especulação imobiliária, a exemplo do loteamento da então vereadora Dadá, aprovado em área, diga-se imprópria, nos limites da área em questão. O golpe de misericórdia veio com a chancela do governo Lula, para a implantação de duas Instituição de ensino federal dentro da APP do rio Sitia e parte integrante da Unidade de Conservação Integral dos Monólitos de Quixadá. Assim, senhores, o buraco é mais em baixo, aqui temos sim mais um caso de abuso de autoridade da gestão petista, perpetuada pela inapetência da atual contra o patrimônio cultural dessa que foi a primeira obra de mitigação do governo Imperial de D.Pedro II contra os efeitos das secas recorrentes no semiárido brasileiro. Essa, todavia, é apenas um lado da moeda, a maculação do nosso cartão de visita ao mundo, na verdade a gestão petista fez da especulação imobiliária um negócio escuso por todo o perímetro urbano da cidade, hoje completamente desfigurada pela terraplanagem de centenas de milhares de metros cúbicos de solo, aterrando lagoas, drenos e a calha do rio que corta nossa cidade ao meio. Quixadá esta fadada ao fracasso de um desastre ambiental, quer tenhamos uma seca pela frente ou um inverno acima da média histórica. A pergunta é: quem vai pagar por isso

  2. Meu Lutero, uma bela explanação, e não sou eu que vou dizer o contrário. concordo com as sábias palavras do JAMAL e até arrisco a acrescentar algo mais. É que na realidade, que bom seria se não estivesse aqui comentando de que sobre a culpabilidade dos orgãos responsáveis, mas sim com consertar, como evitar que aconteça uma outra vez. Acredito que a imposição da culpa vá trazer algo nesse sentido.

  3. Todos sabemos que Quixadá tem uma variedade incrível de pontos turísticos(que por sinal há muito não é valorizado e desenvolvido da forma correta), mas o Açude Cedro com sua beleza centenária, que com toques da natureza fica ainda mais belo, sem dúvida é o grande simbolo da nossa cidade, visto que está presente inclusive na bandeira do município, o qual é conhecido em todo o mundo. Então eu pergunto: até quando as autoridades responsáveis por este complexo histórico centenário vão se fazer de desentendidos, e acharem que ninguém se preocupa com isso, e que não sabemos o valor inestimável que tal complexo tem, não só pra nossa cidade, mas pra todo o Brasil. Espero que quando acordarem, ou deixarem de fingir que estão dormindo, não seja tarde demais pra se recuperar tesouro tão importante, tanto para a história como para o desenvolvimento do turismo em nossa terra dos monólitos. ACORDEM!!!!

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